São José, pai de Jesus e companheiro na fé

São José, pai de Jesus e companheiro na fé 
Igreja dedica cada vez mais espaço ao reconhecimento 
do esposo de Maria como modelo de vida


Por Leonardo Meira


José. Não é preciso pensar muito para lembrar logo de alguém que carregue esse nome. Mas há um homem, em especial, com história singular, repleta da confiança em Deus e no despojamento de si em prol de um acontecimento que transformou a história da humanidade: São José, o carpinteiro, esposo de Maria e pai de Jesus.
Uma das decisões recentes que apontam o interesse da Igreja Católica em destacar o papel de José na história da salvação foi tomada em 1º de maio do ano passado. Com o aval do Papa Francisco, um decreto da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, organismo do Vaticano, inseriu o nome de São José nas Orações Eucarísticas II, III e IV – textos recitados durante a Missa. Já o Papa João XXIII havia inserido o nome do santo no cânon Romano – uma das mais antigas orações litúrgicas – e o Papa Emérito Bento XVI, frente aos numerosos pedidos de diversos lugares do mundo para essa inclusão, pensava em fazer aquilo que Francisco concretizou.
"Trata-se de um enriquecimento nas celebrações. Se todos os santos intercedem por nós junto a Deus e foram servidores de Cristo aqui na terra, com muito mais razão o é São José como pai, educador, protetor e nutridor de Jesus e no céu como Protetor da Igreja. A inclusão do nome de São José nessas Orações Eucarísticas representa que seu nome será mais lembrado e sua missão mais valorizada, pois é preciso lembrar também a sua função no plano da Salvação como chefe da Sagrada Família e esposo da Mãe de Deus, verdade muitas vezes esquecida na missão deste fascinante santo”, destaca o especialista na teologia de São José – chamada de "josefologia” – padre José Antonio Bertolin.


Como chamar José?

Os josefólogos procuram classificar a paternidade de José com vários qualificativos, como "pai virginal”, "pai nutrício”, "pai matrimonial”, "pai legal”, "pai putativo”, entre outros. Uma vez que esses títulos não expressam tudo o que está contido nessa paternidade, a dica é ficar com aquilo que dizem os evangelhos, ou seja: José é o pai de Jesus. É o que indica João, ao falar de Jesus como "filho de José de Nazaré” (1, 45), ou "o filho de José, de quem conhecemos o pai e a mãe” (6, 42). Também Mateus identifica Jesus como o "filho do carpinteiro”(13, 55). E Lucas como "o filho de José” (4, 22); "filho, segundo se pensava, de José”(3, 23).
"A paternidade de José é nova, única e singular, de ordem superior à paternidade natural e adotiva. Não procede da geração segundo a natureza física, mas é fundamentada sobre um vínculo moral, jurídico e espiritual. Mas isso não significa que seja uma paternidade metafórica ou de ‘faz-de-conta’. Esse vínculo é tão verdadeiro e excepcional que não se pode encontrar outro desse tipo no gênero humano”, explica padre Bertolin.
O Beato João Paulo II, na Exortação Apostólica Redemptoris Custos, explica que a paternidade de José não é "aparente” ou "substitutiva”, mas dotada plenamente da autenticidade da paternidade humana, da autenticidade da missão paterna na família. Embora não seja pai pela carne, o é pelo amor. "O filho de Maria é também filho de José, em virtude do vínculo matrimonial que os une: ‘Por motivo daquele matrimônio fiel, ambos mereceram ser chamados pais de Cristo, não apenas a Mãe, mas também aquele que era seu pai, do mesmo modo que era cônjuge da Mãe, uma e outra coisa por meio da mente e não da carne’. Neste matrimônio não faltou nenhum dos requisitos que o constituem: ‘Naqueles pais de Cristo realizaram-se todos os bens das núpcias: a prole, a fidelidade e o sacramento. Conhecemos a prole, que é o próprio Senhor Jesus; a fidelidade, porque não houve nenhum adultério; e o sacramento, porque não se deu nenhum divórcio” (n. 7).



São José "permaneceu durante séculos e séculos em seu característico apagamento, um pouco como figura de ornamento no quadro da vida do Senhor. E foi necessário tempo até que seu culto passasse dos olhos aos corações dos fiéis e despertasse neles singular fervor de oração e abandono confiante”. É o que diz o Papa João XXIII na Carta Apostólica Le Voci.
De fato, o tempo passou e são muitos os fiéis que têm histórias de devoção ao santo, pai de Jesus. Conheça dois desses relatos.

  Pai amoroso

"São José sempre foi para mim um pai amoroso, que fez e faz muito mais que eu ousaria pedir”.
A devoção do engenheiro eletricista Valdivino Simões da Silva começou quando, aos oito anos, mudou-se com a família para Apucarana, no Paraná. Lá, passou a frequentar uma paróquia dedicada ao santo, e o exemplo da devoção de um dos padres do lugar ecoou no jovem.
"Parece um paradoxo, mas São José é tão generoso comigo que o tenho como um pai. Aprendi a recorrer a ele sempre, em todas as causas, mas também aprendi que não preciso recorrer em nenhuma, pois São José tudo pode perante seu Filho Jesus e, mesmo que eu não mereça nem esteja à altura de tão grande bondade, São José me ama e cuida de mim como um filho”, explica.
O devoto tem até blogs na internet para propagar a devoção. No dia a dia, as práticas de piedade incluem "visitas ao Santíssimo na companhia de São José”, oração do Terço de São José, intercessão por quem pede oração e, além disso, ler e escrever sobre o santo a quem chama de pai.
Para Valdivino, a devoção a São José, se praticada de modo maduro, "constitui-se num modo simples e eficiente de se viver a vida cristã. A verdadeira devoção ao Santo Casal constitui-se no mais completo e sublime modelo para a vivência do ‘pequeno caminho’, uma proposta de vida cada vez mais necessária para a humanidade reencontrar-se com o ser Criador e Redentor e, portanto, ser plenamente feliz e realizada”, acredita.

 Reflexo e complemento de Maria

Ita, devota de São José: "quem vem pela primeira vez à minha casa, recebe sempre uma plaquinha de São José para colocar na porta"A baiana Maria do Perpétuo Socorro Moraes Correia, mais conhecida como Ita, não tem dúvidas: a devoção a José também pode dar mais qualidade à devoção mariana, à adoração a Deus e ao seguimento a Jesus. "Não há José sem Maria! Não há Maria sem José! Não consigo olhar para um sem ver o rosto do outro. A mim, emociona muito pensar que Deus também me confiou àquele a quem confiou Jesus e Maria, seus maiores tesouros”.
As raízes da devoção encontram-se na história da família, natural de região afetada pela seca, no interior da Bahia, onde havia devoção muito grande a São José. "Sempre que voltávamos lá, visitar a Capelinha de São José era a ‘obrigação’ primeira da viagem. Depois, ainda adolescente, me ‘enamorei’ por São José. Foi assim que nasceu em mim uma grande admiração pelo santo. Sobretudo pela atitude que teve para com Maria ao ‘descobrir’ a gravidez... Tão divino e tão humano!”, exclama.
A imagem de São José, entronizada na casa de Ita, ao lado do ícone de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro: "Não há José sem Maria, nem Maria sem José!"
E até a casa dela, em Salvador,  é "josefina”. Ita considera o imóvel uma das tantas graças recebidas pela intercessão do santo. Por isso, deu logo um jeito de entronizar uma imagem em lugar de destaque. E, no dia 19 de cada mês, reúne vizinhos, moradores, familiares e amigos para o "café de São José”. No encontro, reza-se o Terço de São José, seguido de um café partilhado. "Quem vem pela primeira vez, recebe sempre uma plaquinha de São José para colocar na porta de casa. E, assim, vou tentando contagiar e alcançar aqueles que encontro pelo caminho, na esperança de apresentá-los a São José, para que ele, com Maria, os apresente a Jesus!”, conclui.

 História e devoção
Os estudos sobre São José foram praticamente nulos nos primeiros séculos do cristianismo. Foi a partir do século XIII que o santo passou a ser considerado nas reflexões dos teólogos, e no século XVI brotaram reflexões mais sistemáticas, o que levou também ao aumento da devoção.
Se o mês de maio é dedicado a Nossa Senhora e, em junho, o Coração de Jesus ganha destaque, a recordação especial de São José no mês de março também tem motivações históricas. De acordo com o especialista em josefologia, padre José Antonio Bertolin, essa escolha foi impulsionada com a publicação, em 1810, em Roma, do livro O mês de março consagrado ao glorioso Patriarca São José, esposo da Virgem Maria para obter o seu patrocínio na vida e na morte. Quem se ocupou com a edição da obra em maior tiragem, em 1844, foi São Gaspar Bertoni.
Essa prática foi aprovada pelos papas. Foi o que fez Pio IX, em 1877, permitindo que as celebrações começassem em 16 ou 17 de fevereiro e terminassem em 19 de março, dia da festa litúrgica do santo. E Leão XIII, na encíclica Quamquam pluries, de 15 de agosto de 1889, recomenda aos cristãos ao menos um tríduo de oração por ocasião da festa. Recomendações à devoção também foram feitas por Bento XV, João XXIII e pelos pontífices mais atuais, de João Paulo II a Francisco.
Já a dedicação de um dia da semana – quarta-feira – ao santo encontra suas raízes no século XXVII, também na Europa. Uma série de religiosos propunha práticas nesse sentido. Foi o que fez, em 1645, o carmelitano francês Antonie de La Mère de Dieu; em 1676, o carmelitano belga Ignace de Saint-François; e, em 1700, Madre Marie-Marguerite de Valbelle. Práticas que foram consolidadas com o incentivo dos papas, especialmente por meio da concessão de indulgências*, como fez Inocêncio XII, em 1695, aos membros da Confraria de São José que visitassem na quarta-feira a igreja dos carmelitanos descalços em Bruxelas. Já Pio VII, em 1819, concedia indulgência para todas as quartas-feiras do ano a quem rezasse nestes dias as Dores e Alegrias de São José. Até que, em 5 de julho de 1883, o papa Leão XIII confirmava a quarta-feira como dia de São José em toda a Igreja, com missa votiva (dedicada ao santo) correspondente.
Após o Concílio Vaticano I, em 8 de dezembro de 1870, São José foi proclamado Patrono da Igreja pelo Papa Pio IX – o mesmo que proclamou o dogma da Imaculada Conceição, em 1854. E no século 20, o pai de Jesus foi proclamado por João XXIII patrono do Concílio Vaticano II, que construiu trilhas para a caminhada da Igreja no mundo contemporâneo.
Além da missa e comunhão, com que costumam honrar o santo, os fiéis também têm algumas orações e devoções particulares. Aí se inclui a Coroa de São José, Oração dos Sete Privilégios de São José, Devoção dos Sete domingos em honra de São José (dedicados em honra e veneração das sete principais dores e sete gozos que teve São José durante sua vida mortal).
  
* Segundo a doutrina católica, embora o sacramento da Penitência (Confissão) perdoe a culpa do pecado, resta a pena temporal exigida pela Justiça divina, que deve ser "paga” na vida terrestre ou no purgatório. A indulgência oferece ao pecador penitente os meios para "quitar” esta dívida durante sua vida na terra, reparando o mal que teria sido cometido pelo pecado.


Para ler o artigo direto do site de origem, clique aqui